It is quite funny

Tenho um costume engraçado.
Gosto de me sentar no chão, ao lado da janela, escondida pela cortina. Muitas das vezes, chegam a casa, aqui no Subsolo City, e perguntam por mim, passam pelo meu quarto e não me veêm. Nunca me apetece responder, embora acabe, eventualmente, por fazê-lo. Talvez porque quando me sento ali, ou é de dia e estou a ler, ou é de dia e estou a ver o jardim para onde dá a minha janela (tudo iluminado artificialmente, claro. Isto no Subsolo é só tecnologia de ponta) ou é de noite e simplesmente estou a coscuvilhar. Estou a infiltrar-me nas vidas alheias e a imaginar o que cada um é, a sua profissão, os seus dramas pessoais, as suas fraquezas... Era precisamente isso que estava a fazer há uns segundos atrás.

A persiana está a meio. A noite está inquietantemente amena, especialmente para Outubro. Sinto o cabelo molhado na t-shirt do pijama e as pernas nuas cruzam-se. Encosto o joelho e a cabeça à janela. A música lamechas, previamente escolhida, toca no computador - este em que agora escrevo- e o pensamento voa. Penso nos meus medos - naquilo que mais me atormenta, que são os "ses" - terríveis inimigos, isso vos digo. São o reflexo de muitas ansiedades.
Deixo-me disso. A música pode ser lamechas, o quarto pode estar escuro e posso estar sentada no chão, junto à janela com a cabeça encostada ao vidro, mas estou bem-disposta. Melancolia não é sinónimo de tristeza, pelo menos no meu dicionário (Grande Dicionário para Tubérculos - eu sabia que não conheciam vv.). Então observo.

Uma senhorita anda com passinhos minúsculos e rápidos. Quase ridículamente. Se andasse com os pés ligeiramente para o lado, parecer-me-ía um pinguim. Vejo melhor e "Ah... é uma pena!" - pés direitinhos. Começo inevitavelmente a imaginar quem possa ser e a sua história, e estava a começar a ficar interessante e... "Oh --' é a minha vizinha do rés-do-chão". Bolas. Não foi desta.

Uma rapariga vem debaixo do meu quarto com um saco. Vai ao caixote do lixo. Abre e coloca o saco. Simultaneamente, um senhor de meia-idade vem de outra direcção, pelo passeio, passando pelo caixote do lixo. Quase a chegar lá, dá meia-volta. A tampa fecha. A rapariga esfrega os dedos. Ah! É engraçado como todos fazemos isso - aquela resina e líquidos repugnantes do lixo, acabam sempre por nos tocar. O senhor vira, outra vez em direcção ao caixote. Observo expectante. Será que vai tentar algo com a rapariga?
Ao que parece tivemos o mesmo pensamento. Ela olha por cima do ombro,inquieta, à medida que vai regressando a casa. A penumbra da árvore que envolvia o homem, começa a dissipar-se, enquanto elese vai dirigindo para a luz. Rio-me. É meu vizinho. O marido da minha vizinha. Provavelmente aquela meia-volta foi para ver se a via. Talvez se tivessem desencontrado... É um senhor de família. Um vizinho simpático.

Da direcção da porta do meu prédio vejo um casal. São os vizinhos da porta ao lado. Parece que estou sem sorte com os transeuntes - não posso imaginar as vidas, porque as sei. Enfadonho. Íam, quase de certeza, buscar as miúdas ao basquet. Enquanto se dirigiam para o carro, cruza-se um senhor com eles. Era a minha última hipótese. Ainda está longe, mas depressa percebo que vai ao caixote do lixo. Olho para ele. É o marido da minha antiga empregada.

Por favor, preciso de uma moral da história.
1) O caixote do lixo é um ponto de encontro
2) O caixote do lixo proporciona-nos boas histórias.
3) O Mundo é Pequeno.
4) Hoje não foi um bom dia para imaginar.

E, já que estamos numa de partilhar, a música (linda) que estão a ouvir é a tal lamechas ^^

Batatinhas (:

Comentários

  1. Moral da história: morre. Mas antes escreve um testamento onde me deixas as tuas riquezas, se não te importares. Incluindo aquele perfume cheiroso ;) jokaaaaax

    ResponderEliminar
  2. mas tu já és como eu, também não aprecio batatas cozidas.

    :D

    ResponderEliminar
  3. O que eu faço quando vou ao caixote do lixo é (consiste num processo com 3 fases - e é SUPER PERIGOSO):

    1º Carrego no pedal com muita força
    2º Antes que a tampa volte a cair atiro para lá o saco (se falho, sou uma rapariga morta)
    3º Pernas para que te quero! Lá vem o bafo.


    E é assim que eu sobrevivo neste Mundo.

    Agora, tu és... como hei-de dizer isto de uma maneira suave... Triste. Sim, é isso. Não, calma, desesperadamente triste.

    And yet? Oh, yes. I do love you, beautie.

    ResponderEliminar
  4. *Joana: odeio que me mandes morrer. Magoa-me o coração, mas enfim... ja estou habituada -.-
    Deixo-te o perfume, sim (:

    *ionworm: indeed. As batatas cozidas são o nosso ponto de convergência, pelo menos na culinária :D Mas um dia, vou escrever assim^^

    *S-bug:
    "3º Pernas para que te quero! Lá vem o bafo.", somos duas, baaah :|
    I love you too *.*

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares deste blogue

Harnessing the healing power of Batata: How journaling non-sense stuff can boost your serotonin levels and improve your well-being.

Bernoulli

O Eça de Queirós era um tipo engraçado#1 "O desabafo da Batata - Batata governa o Mundo"